Entrevista – Professor Ricardo Barreto

A equipe do Jornal Pelicano tem o privilégio de trazer a entrevista com o professor Ricardo Barreto. Oficial da Marinha Mercante - Maquinista com orgulho - advogado, engenheiro e professor da EFOMM, em seus trinta anos de formado, o professor Barreto agrega experiências e conhecimento e o resumo de sua carreira profissional pode ser lido como um estímulo a todos que pretendem ingressar na carreira mercante.

JORNAL PELICANO – Quando se formou, como escolheu a empresa para praticar e quais lições tirou dessa época?

RICARDO BARRETO – Faço parte da Turma CLC Lauro Augusto Teixeira de Freitas, que ingressou no CIAGA em 1982 e formou-se em 1984. A escolha da empresa para a realização da praticagem foi em razão da disponibilidade.  Vivíamos uma época de crise. A primeira vaga que surgiu, dois dias após a festa de formatura, foi a que peguei.  Isso me causou um problemão no término da praticagem, pois não sabia que a empresa que tinha feito meu primeiro estágio (naquela época fazíamos dois estágios ao invés de um único) havia enviado um comunicado ao CIAGA para que eu retornasse ao DOCEALFA. O Comandante do Docealfa, Comandante Benedito Jordão de Andrade, havia sido Imediato do CIAGA e o Chefe de Máquinas, o saudoso OSM Adair Nogueira, havia sido professor do CIAGA por mais de 16 anos. Conforme citei, vivíamos mais outra época de crise na Marinha Mercante, nesses momentos a têmpera marinheira é fortalecida!  Naquela época não se falava na sequer possibilidade dos marítimos brasileiros trabalharem em outros países sem sairmos da nossa profissão.  Esse foi o grande aprendizado e triunfo da nossa classe!

JORNAL PELICANO – Ano que vem sua turma de EFOMM completa 30 anos. Quais as principais mudanças que o senhor enxerga quanto à formação acadêmica e a estrutura da escola atual em comparação com a EFOMM do tempo do senhor?

RICARDO BARRETO – Sou suspeito para essa resposta.  Vocês sabem o quanto eu amo a nossa instituição de ensino.  Diversos problemas foram e serão originados pelo fato de ser uma instituição voltada à capacitação profissional de uma atividade internacional.  Com o advento da comunicação e informação em tempo real e voltada a uma tecnologia em constante evolução, temos a obrigação de atualizações ininterruptas.  Não há vagas para “aventureiros de semestre”.  As pessoas dedicadas à atividade de ensino têm responsabilidade e consciência dessa realidade.  Vocês sabem o quanto nós incentivamos o questionamento e o debate dentro e fora das salas de aula.  Esse é o futuro do ensino; vocês precisam entender que somos orientadores da criatividade de suas inteligências, e esses conceitos são diretamente vinculados com a responsabilidade profissional.  São milhões de dólares investidos em tecnologia e outros bilhões em responsabilidade civil, administrativa e criminal; é o nome das nossas famílias e do nosso país que estão em jogo.  Não se pode negligenciar essa realidade.

JORNAL PELICANO – Quando aluno, o senhor cogitava a possibilidade de voltar ao CIAGA como professor?

RICARDO BARRETO – Não.  Não fui exceção dos sentimentos dos recém regressos do CIAGA…Nunca cogitei de trabalhar no CIAGA.  Na realidade só fui me entender como profissional de ensino, após ter sido motivado ainda a bordo, para treinar meus subordinados e principalmente meus praticantes. Naquela época havia grandes dificuldades de comunicação na nossa atividade.  Mas foi exatamente de volta ao meu país, e ao CIAGA, que encontrei a felicidade profissional que tanto havia buscado, no Brasil e fora dele. Lembro de uma frase do serviço de orientação pedagógica do CIAGA há algum tempo: “Seja o professor que você gostaria de ter tido”.  Tomo essa como minha frase de efeito!

JORNAL PELICANO – Por que a escolha de se formar em Direito?

RICARDO BARRETO – Faço parte de um grupo de amigos, uma irmandade, que crê na igualdade entre os homens.  Em função da necessidade que injustiças sejam revertidas, a orientação mais adequada seria o estudo do Direito, enquanto ciência social.  Como na época do início da faculdade de direito, já trabalhava como chefe do turno da noite daquela saudosa empresa que funcionava ao lado do sambódromo, foi uma relativa satisfação poder conviver e aprender um pouco de uma realidade que para nós da área técnica era tão intrigante.  Foi pelo estudo do Direito que pude entender o termo “evolução”.

JORNAL PELICANO – Além de lecionar no CIAGA, o senhor também realiza inspeções em navios. De que maneira as atividades se complementam?

RICARDO BARRETO – A complementação de atividades existe em função da necessária atualização dos conceitos debatidos em sala de aula.  Não é possível falarmos em sistemas operacionais de um navio se não conhecemos esses sistemas e a necessidade do cumprimento da legislação que os precede.  Como tive a oportunidade de trabalhar em uma das principais sociedades classificadoras ocidentais e pela formação jurídica, tento passar o máximo da minha curiosidade para o corpo discente do CIAGA de uma forma responsável, pois vivo profissionalmente o que a legislação preceitua para nossa atividade, que tem toda uma potencialidade de dano à salvaguarda da vida humana, e aos patrimônios privado e público, enfim, ao meio ambiente.

JORNAL PELICANO – O senhor leciona Sistema de Propulsão Auxiliar para Náutica. Qual a importância dessa disciplina, cujo conteúdo envolve o conhecimento sobre máquinas, para quem vaio trabalhar no passadiço?

RICARDO BARRETO – Sem a necessária integração das informações do conjunto do navio, e isso significa obter as necessárias informações da praça de máquina e respectivos sistemas, não há como realizar uma navegação competente e profissional nos moldes exigidos pela convenção STCW.

JORNAL PELICANO – Para os que pretendem ingressar na EFOMM, quais conselhos o senhor pode dar?

RICARDO BARRETO – Poderia parafrasear uma das músicas mais bonitas do cancioneiro popular, elaborada pelo Nélson Mota e o Dori Caymmi, chamada “Saveiros”, entretanto, modestamente digo: “Venham enrijecer a têmpera com o comprometimento e a responsabilidade daqueles que a mar deixa retornar!” Aos membros do Jornal Pelicano, agradeço pela generosidade e inteligência na elaboração dos quesitos. Com as tradicionais saudações marinheiras.