Ele guardava a sete chaves, em um pequeno pedaço de papel, uma informação valiosíssima. Várias vezes o Capitão era surpreendido no passadiço, consultando seu papelzinho secreto e logo em seguida, executava as manobras com grande habilidade.

E assim ele sempre procedia. Por ocasião das chegadas nos portos ou ao suspender, consultava a misteriosa informação no papel, dispensava o serviço do pratico e executava as manobras, quer seja de atracação ou desatracação com muita habilidade e demandava o canal, entrando e saindo com o navio, sem dar satisfação a ninguém. Era um verdadeiro expert no assunto. Nacionalmente reconhecido, não utilizava praticos, entrava e saia de qualquer barra de qualquer porto, sem orientação da praticagem e com poucos recursos, apenas consultando o segredo escrito no pequeno pedaço de papel.

A curiosidade era tamanha que certa ocasião perguntaram – “Comandante o que tem escrito nesse seu papelzinho misterioso ?”

E o Capitão respondia – “Nada que você não saiba, são detalhes e coisas de Capitão”.

É evidente que ninguém se deu por satisfeito, porquanto aquela resposta não justificava toda a sua habilidade nas manobras do navio. Certa ocasião, o navio foi nomeado para um porto bem desconhecido e de difícil acesso, cuja manobra muito poucos conheciam, contudo o Capitão não se abalou e logo após ter consultado seu pequeno documento confidencial, executou com brilhantismo a manobra de entrada e atracação no tal porto dificil, sem o auxilio de pratico e rebocadores.

O Capitão foi elogiado pelos armadores, pela comunidade maritima, por todos que o cercavam e ele pouco se sensibilizava com aquela situação, pois achava isso tudo muito normal

O Comandante foi chamado a prestar palestras sobre manobras, foi convocado para dar aulas nas escolas de navegação, mas ele , friamente, não se perturubava com todo esse assédio e sempre se mantinha na mesma linha, calma e serena, sem dar muita satisfação para seus colaboradores.

Ocorreu que todo aquele mistério estava incomodando o staff da náutica do seu navio. Imediato e Pilotos queriam saber a todo custo que segredo estava escrito naquele pedaço de papel e que informações sigilosas deveriam conter ao ponto do Comandante manobrar tão bem em todos os portos, dispensando até mesmo os serviços de praticagem e rebocadores.

Assim sendo, o Imediato resolveu colocar um plano em pratica – “Vamos observar e vigiar o Capitão a todo momento. Não podemos perder um gesto sequer e quando ele se recolher ao camarote, para seu descanso habitual, vamos arranjar um bom motivo para acompanhá-lo e atentar ao maximo, com olhos de águia, para o local onde ele vai guardar o papelzinho e depois que o homem cair no sono, poderemos enfim, consultar as informações, sem que ele perceba”.

O plano foi colocado em pratica, vigiaram disfarçadamente todos os passos e gestos do Capitão, contudo , após todo aquele plano ostensivo , constataram que o Capitão levou o seu papelzinho secreto para o beliche e o colocou debaixo do travesseiro, frustrando mais uma vez seus incautos caçadores.

“Não aguento mais !!!!” – Exclamou o Imediato. Vamos tomar atitudes mais radicais e sem pensar muito, colocou a mão no botão de alarme geral e disparou o toque de incêncio.

Com o soar do alarme, o Comandante levantou-se subitamente, subiu ao passadiço e o Piloto, mais que rapidamente, entrou em sua cabine, colheu o papelzinho sob o travesseiro, abriu e leu o que estava escrito e tão logo recolocou “aquela joia preciosa” sob o travesseiro sem deixar vestigios.

Os oficiais disfarçaram a ocorrência, presumindo o combate a um principio de incêndio na proa que de fato não existiu, enrolaram o Comandante com algumas palavras ensaiadas e este, pouco convencido, voltou a descansar na tranquilidade de sua cabine.

Após todo esse episódio o navio voltou a rotina normal e era grande, clara e visível a decepção no rosto de todo “staff” de náutica, porquanto no papelzinho estava simplesmente escrito em letras garrafais:

“DIREITA BORESTE E ESQUERDA BOMBORDO”.

De tudo isso aprendemos mais uma vez a seguinte lição:

“A receita, todos conhecem, mas o toque pessoal é que faz a diferença”.

Saudações Marinheiras

Por Francisco Gondar