Entrevista – Professor José Ricardo

O 1º Oficial de Náutica Ricardo fala sobre a etapa de instrução, os planejamentos futuros na carreira e a vida a bordo. Uma verdadeira aula para quem pensa em ingressar na profissão, para quem está já está no curso e para os que já vivem embarcado.

Alguns Conselhos

Bom, aprendi que se conselho fosse bom nós venderíamos e não os daríamos. Desta forma, prefiro sugerir aos praticantes que já comecem a adotar postura de oficial. O que quero dizer com isto, quero incentivá-los a serem diligentes em seus trabalhos, usarem seus conhecimentos adquiridos durante todo o período na escola, e não somente os das minhas aulas. Perguntando sempre que tiver dúvidas, nunca tendo receio de assumir que não sabem algo, por mais banal que possa parecer; jamais concorrendo com os colegas na tentativa de mostrar superioridade. A bordo não pode haver disputa por reconhecimento; o reconhecimento virá com certeza, cedo ou tarde, pois todos são avaliados e os critérios para tal avaliação são “pré-determinados” e de maneira tal a não serem tendenciosos.

Aí você pode me perguntar: mas mestre, uma indicação do comandante (de caráter pessoal) não pesa mais que uma avaliação do RH com perguntas e respostas? Eu diria que um comandante, como qualquer ser humano, tem suas preferências e afinidades. Entretanto, na Marinha Mercante, e principalmente no offshore, as avaliações e cartas de recomendações só fazem você ficar em evidência para outras entrevistas/avaliações. Ou seja, mesmo um comandante endossando sua indicação, você ainda será avaliado, entrevistado e testado pelos gerentes de RH, gerentes de contrato, superintendentes marítimos, dentre outros. Desta forma, se a sua “carta de indicação” for uma falácia, certamente você não irá muito além destas entrevistas e testes.

No céu todas as estrelas brilham sem que nenhuma tenha de ‘apagar’ o brilho da outra. Na Marinha Mercante vocês também podem brilhar sem ter que ofuscar o brilho de um colega!

1ON José Ricardo

Outro ponto importante é a questão do posicionamento pessoal. Trata-se de ética! Em todos os sentidos. E, por favor, nunca confundam franqueza com falta de educação. Às vezes pensamos estar sendo francos e transparentes nas palavras, sem nos darmos conta de que estamos constrangendo alguém bem próximo. Falem, argumentem e exponham seus pontos de vistas, mas de maneira sábia, na hora certa, com as palavras certas e pertinentes, sem pré-julgamentos, e etc… E sempre com bases técnicas cientificas/operacionais.

“Não exponham intimidades e particularidades da sua vida pessoal a bordo. Sejam reservados, mas não isolados, sejam alegres, mas não inconvenientes, sejam ousados, mas nunca abusados.”

Quanto às divergências de credo, raça, opção sexual, política entre outras deste cunho, prefiro dizer que devemos dar o devido respeito a todos e NUNCA discriminar ao próximo. Lembrem-se que se você tem qualquer tipo de preconceito cultural, de raça, político, religioso ou orientação sexual certamente você está na profissão errada. A Marinha Mercante é maior do que imaginamos, não apresenta fronteiras; nosso STCW é “um passaporte com visto para todos os países” e as diferenças são constantes em nosso ambiente de trabalho. E, por favor, não exponham intimidades e particularidades da sua vida pessoal a bordo. Sejam reservados, mas não isolados, sejam alegres, mas não inconvenientes, sejam ousados, mas nunca abusados.

Enfim, sejam oficiais mercantes cumprindo seus deveres e fazendo-se respeitados por todos e defendendo seus direitos adquiridos por convenções, acordos coletivos de trabalho, leis nacionais e internacionais.

Por fim, e não menos importante: orgulhem-se de serem mercantes! Procurem se informar, não estejam alienados à situação político-econômica do nosso país e do mundo, mas, por favor, cuidado para não dar crédito a especulações da mídia, mentiras plantadas e que, mal interpretadas, podem leva-los ao desestímulo e afastamento da profissão. Eu garanto a vocês que essa é uma profissão linda, nobre e com oportunidades ímpares de crescimento pessoal e profissional.

Preocupem-se neste primeiro momento em estudar, ampliar seus conhecimentos técnicos, ter uma boa formação, fazer a praticagem (que é longa e árdua, pois é feita em pelo menos um ano a bordo de embarcações offshore ou navios mercantes) e obter o STCW de 2ON ou 2OM.

Lembrem-se que a Marinha Mercante é composta de vários segmentos. Por isso, procurem conhecer o máximo possível de oportunidades que esta profissão oferece enquanto alunos; façam visitas a estaleiros, embarcações, escritórios de empresas afins, conversem com profissionais experientes, brasileiros ou estrangeiros, e estudem a língua inglesa continuamente, tanto oral quanto na escrita. Busquem fluência neste idioma pois ele é a nossa linguagem universal. Até mesmo empresas 100% nacionais fazem uma parte da entrevista de emprego em inglês. Mas, calma! Caso você não domine o idioma, não se desespere. Apenas reveja suas prioridades e comece a estudar; se aplique com afinco e não desista!

Gostaria de deixar uma mensagem de agradecimento aos meus 140 colegas de profissão que adquiri quando fui escolhido para lecionar para o 3° ano de náutica. Agradecer também ao Jornal Pelicano pela oportunidade de compartilhar minhas ideias, pensamentos e experiências através desta entrevista.

Fiquem com Deus, sucesso na profissão que escolheram e, sempre que precisarem, contem comigo! Afinal, sou tão mercante quanto vocês, isto é, estamos todos no mesmo navio!

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Aluna do Segundo Ano de Naútica da Escola de Formação de Oficias da Marinha Mercante